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Malasartes e o Duelo Com a Morte: cinema de qualidade com frescor

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“Ser livre sempre foi a grande ambição dos homens”

Gaiato, malandro, escorregadio, sedutor. O astuto herói, famoso nos contos populares por suas artimanhas, parece ter sido feito sob medida para a cultura brasileira, apesar de ter sido trazido na bagagem pelos povos ibéricos (Portugal e Espanha) e figurar em muitas culturas diferentes.

A inventividade da língua portuguesa e do folclore nacional dão a Malasartes um jeitinho todo brasileiro de ser. A traquinagem e o gingado estão no nome e Jesuíta Barbosa carrega no olhar e nas expressões a alma do personagem de forma encantadora.  É impossível não se afeiçoar aos grandes olhos expressivos e as caras e bocas de Jesuíta Barbosa que está arrebatador e envolvente como Pedro Malasartes. Uma atuação de tirar o chapéu e escancarar os dentes, porque mesmo quando não faz rir, arranca sorrisos.

Pedro Malasartes é afilhado da morte, que o escolheu, justamente pela sua astúcia, para substituí-lo. Depois de dois mil anos, responsável pelo destino dos homens, após ter roubado o poder de interromper as linhas da vida da bruxa Parca cortadeira (Vera Holtz), foi ficando cada vez mais entediado, mas para se livrar da maldição do destino que ele mesmo escolheu precisa de um substituto.

Ele tem o dom de se meter em encrenca e assim acompanhamos suas desventuras enquanto ele tenta, com muito gingado e inventividade, se livrar de uma série de confusões nas quais muitas vezes ele mesmo se enfiou.

Pedro espera ansiosamente pela chegada do padrinho, que segundo sua mãe é um homem poderoso, na esperança de que ele possa ajudá-lo a se livrar de uma dívida com Próspero, vivido por Milhem Cortaz (Tropa de elite, Assalto ao banco central). Próspero é irmão de Áurea, vivida por Ísis Valverde (Faroeste caboclo), que vive as voltas num romance com Malasartes, que, assim como em tudo, vive se esgueirando da moça porque o que ele quer mesmo é ser livre. Livre da dívida, livre pra viver a vida, livre pra conhecer o mundo.

Mas, para ser livre ele precisa ser muito esperto. Mais esperto que o padrinho, A Morte, encarnada por Júlio Andrade, que fará de tudo para voltar a viver. Mais esperto que as linhas do destino e as bruxas, que querem voltar a cortar o fio da vida. Mais esperto que Esculápio, vivido por Leandro Hassum, o ajudante da Morte, que não gostou nada da ideia de um substituto.

O trio Pedro Malasartes (Jesuíta Barbosa), Áurea (Isis Valverde) e Zé Candinho ( Augusto madeira), tem uma excelente química e acompanhar as andanças desses três é sem dúvida divertido. O filme tem muitos bons momentos para os atores e de maneira geral, cada um deles tem um grande instante em que seu trabalho com o personagem se destaca. Mas Augusto madeira está simplesmente encantador na pele do ingênuo e bondoso Zé Candinho, melhor amigo de Malasartes.

O roteiro de Paulo Morelli faz um belíssimo uso da língua portuguesa, brincando com os falares, expressões e ditos de forma encantadora. Além disso, cada personagem possui seus trejeitos e peculiaridades desenvolvidos em detalhes que são mérito de um roteiro bem desenvolvido, em que pequenas particularidades fazem a diferença em muitos momentos. Narrativamente o filme possui muitas soluções divertidas e criativas e se destaca nos pormenores.

O filme é envolto em magia e pra isso há toques extras de computação gráfica, para dar vida ao mundo da morte e ao passeio desses personagens entre os dois mundos. O filme que mais se utiliza desse recurso na história do cinema brasileiro, tendo cerca de 40% das cenas fazendo uso do CGI. A computação ajuda a dar forma ao mundo da morte e apagar a modernidade do mundo dos vivos, dando ares mais interioranos e caipiras e é muito bonito e interessante em muitos momentos, mas está longe de ser o ponto forte do filme. Na verdade, é um belíssimo exemplo daquela velha máxima “Menos é Mais”.

O uso excessivo do CGI empobrece algumas cenas em que diferentes recursos de direção, de câmera, de estilo, poderiam ter sido utilizados para solucionar questões em que o uso da computação ficou simplesmente repetitivo e pouco funcional na realidade, dando a impressão de que em alguns momentos está servindo mesmo para se utilizar de algo que estava disponível.

“Vamos molhar as palavras”. O grande mérito do filme está na magia das palavras, no roteiro e no mérito das atuações e desenvolvimento dos personagens. A magia do que pode ser feito com o real, com o humano é o que mais se destaque nesse delicioso filme, que é um presente ao público brasileiro. Um bom texto, soluções criativas e ótimas interpretações.

Um filme que se usa de um humor leve, capaz de trazer o riso fácil com um texto excelente e belo uso da comédia corporal, soluções divertidas e excelentes atuações. Um grande exemplo de um cinema brasileiro que funciona, e o seu funcionar nada tem a ver com a tecnologia, mas sim com o que temos de melhor, que é sempre o humano, prova de que esse é, sim, o melhor dos mundos.

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