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NOS VEMOS NO PARAÍSO: UM GOLPE ARTÍSTICO

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Dois homens absolutamente diferentes se conhecem durante os horrores da Primeira Guerra após um salvar a vida do outro. Albert Maillard (Albert Dupontel) é um homem de meia-idade, ex-contador, pertencente à classe trabalhadora, enquanto Édouard Péricourt (Nahuel Perez Biscayart) é um jovem de alma artística da elite, filho do presidente Marcel Péricourt (Niels Arestrup); porém, dessa improvável combinação, surge uma inesperada amizade, cuja prova de fogo é aplicar um golpe na construção do memorial aos mortos na guerra enquanto tentam contornar e desmascarar o corrupto tenente Henri Pradelle (Laurent Lafitte) – o qual lucra com os corpos dos mortos na guerra -, artimanha narrada em retrospecto por Maillard. Este é o enredo da dramédia “Nos Vemos no Paraíso”, adaptado do romance de Pierre Lemaître e dirigido pelo próprio Dupontel.

O primeiro acerto do longo é ter o seu próprio tempo, saber desenvolver sua história sem se apressar para chegar ao plot principal – em vez disso, o roteiro se preocupa em construir as suas personagens de maneira consistente, uma tarefa cumprida com êxito. Maillard é um homem que passou por muita coisa e, após o fim da guerra, sobrevive como pode e a interpretação de Dupontel é adorável, exibindo uma aura a la Chaplin. Já Biscayart teve a quase impossível tarefa de dar vida a um anti-herói que quase não fala – uma vez que a metade inferior de seu rosto ficou deformada por causa dos conflitos – e passa a maior parte do filme sob máscaras que deixam apenas seus olhos à vista.

No entanto, ao apresentar uma interpretação teatral e visceral que não poupa gestos e olhares certeiros, dosando precisamente delicadeza, intensidade, raiva, rancor, alegria e até mesmo um certo grau de luto – uma vez que ele convence a todos de que morreu na guerra -, Biscayart transforma Édouard em uma personagem extremamente cativante e, por vezes, hipnótica, fazendo com que seja impossível não se apaixonar e torcer por ele, apesar da conduta discutível. Sem dúvidas, é um trabalho de atuação que deve ser usado como modelo e inspiração para outros – vale lembrar que Biscayart ganhou o César de Melhor Ator Revelação por 120 Batimentos por Minuto na cerimônia de 2018, mesmo ano em que  Nos Vemos no Paraíso foi um dos destaques da premiação. E, além disso, Maillard e Édouard contam com a ajuda de Louise (Héloïse Balster), uma destemida e carismática garota que, além de ajudá-los ativamente no golpe, age como uma espécie de intérprete de Édouard. Eles acabam por formar um trio pelo qual não tem como não torcer.

E, entre as personagens coadjuvantes, o que mais se destaca é o tenente Pradelle, que assume o papel do vilão clássico: bonito, charmoso, canalha e mau-caráter. É aquele tipo de antagonista que o espectador teme, mas gosta de ver em ação realizando suas tramóias. O restante do elenco está bem em seus papéis, e, mesmo não tendo tanto tempo em tela, cada um tem o seu momento – Émilie Dequenne, que interpreta Madeleine, irmã de Édouard, realiza um bom trabalho como uma mulher forte que conhece a sociedade em que vive, portanto, deve saber equilibrar delicadeza e atitude; Mélanie Thierry, que dá vida à doce empregada Pauline, é simplesmente adorável; e Arestrup consegue emocionar como um homem duro em luto pelo filho que ele acredita estar morto. Talvez o único ponto baixo seja Labourdin (Phillipe Uchan), o assistente do presidente, que deveria ser um alívio cômico, porém ele é tão absurdamente estúpido que o tom pastelão provoca no público apenas um eye rolling.

Já nos aspectos técnicos, o filme é um primor. A cinematografia é impecável, trazendo um tom fantástico às imagens, as quais dão à história uma atmosfera que beira o conto de fadas – aura que ainda mais elevada pela belíssimas máscaras produzidas e usadas por Édouard, o que faz com que elas não sejam meros acessórias, mas ajudam a contar a história da primeira à última cena; cada uma delas tem um significado e complementa a interpretação de Biscayart. Os efeitos visuais também são de cair o queixo – com o perdão do trocadilho -, em especial na cena em que Édouard tira a máscara. E a trilha sonora apurada, que em alguns momentos beira a magia, é o toque final dessa produção afiada. Não foi à toa que o longa foi um dos grandes vencedores do César 2018, com cinco prêmios – Melhor Direção, Melhor Adaptação, Melhor Fotografia, Melhor Figurino e Melhor Direção de Arte. Assim, “Nos vemos no Paraíso” é um filme muito bem realizado, envolvente e empolgante que vai muito além do puro entretenimento.

 

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