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Culpa e Desejo traz à cena a consciência do ser humano perante seus erros

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Catherine Breillat é uma das mais importantes diretoras francesas, sempre trabalhou muito bem as polêmicas que permearam seus filmes, e foi uma das primeiras diretoras a utilizar sexo explícito em um longa metragem (Romance). Recentemente, anunciou que Culpa e Desejo encerraria sua carreia de quase cinquenta anos com esse título, aliás, esperamos que ela repense a decisão. Uma diretora corajosa como ela ainda poderia render mais alguns títulos, mesmo já estando aos 75 anos. Um segundo motivo para mudar de ideia seria a de encerrar suas atividades com um título mais inspirado que esse aqui, que além de ser um remake desnecessário, não acrescenta nada à sua filmografia que ela não tenha apostado anteriormente.

Culpa e DesejoO original chama-se Rainha de Copas, e é uma produção dinamarquesa que fez algum sucesso por aqui há quatro anos atrás, colocando a talentosa Trine Dyrholm em uma situação surreal e delicada. Essa mesma situação se repete sob a batuta de Breillat, com a igualmente excelente Léa Drucker protagonizando. Trocando em miúdos, trata-se de uma advogada especialista em direitos do menor que se vê cedendo ao desejo de seu enteado de dezessete anos. Tudo isso acontece sob às vistas do marido e das duas filhas pequenas do casal, em uma situação que flerta com dicotomias a respeito de liberdade e moralismo, pedofilia e paixão cega. Tanto na produção original quanto nessa releitura problemas são avistados.

Se no original, as questões morais criavam um painel mais explícito do que se desenrolava no seio familiar, o problema de Culpa e Desejo deságua em questões subjetivas. Vivendo um casamento feliz com um homem que a satisfaz sexualmente – é o que o filme mostra, já que os personagens não se revelam para além do que fazem no plano – charmoso e educado, como pode uma mulher madura e elegante se envolver com um menino tão sem graça? O ator Samuel Kircher pode se enquadrar absolutamente no que o roteiro pede, mas não é nem um coerente o que o filme venda. Uma pessoa com mais de 40 precisaria estar desesperada para ter uma sede saciada em alguém tão desinteressante, ou seja, sem qualquer qualidade, intelectual ou estética.

Breillat não consegue nos convencer da necessidade da aproximação de seus personagens para o com o outro, soando sempre como algo arbitrário e sem sentido. Mesmo o adolescente, não soa crível sua conexão com a madrasta, do qual ele não cria nenhuma ligação maior antes que a explodam os eventos. Talvez seja uma conclusão apressada a que o filme desenrola, e as tais Culpa e Desejo não chegue a tempo. Com domínio de construção de imagens, o que a cineasta não consegue acessar é a nossa predisposição a encontrar nesse envolvimento elementos suficientes para que tudo faça sentido, do início ao fim.

Drucker, que foi muito premiada pelo belo Custódia, emprega a ambiguidade necessária para a virada da personagem. Sua experiência ajuda a manter nossa atenção ao desenvolvimento, que não é conseguida com o mesmo êxito por Kircher. Em determinado momento, sua imagem parece a de uma criança triste por ter perdido um bicho de pelúcia, o que mais uma vez, nos faz não compreender a decisão por esse envolvimento. Quando ele chega em casa com uma menina em determinada cena, também não conseguimos acreditar que ele tenha conquistado mesmo alguém de sua idade, o que deixa claro como sua figura só provoca descrédito e aborrecimento.

Ao fazer essas conexões coletivas, parece uma escolha deliberada por transitar de maneira arbitrária entre os impulsos de personagens tão diferentes. Culpa e Desejo talvez tenha escolhido filmar a falta de sentido de algumas atitudes que temos, para nos mostrar o quanto somos falíveis, e propensos a um erro contínuo. Que suas escolhas descambem para a falta de credibilidade, creio ter a ver com uma combinação de erro de escalação de elenco com opção pela falta de diálogo dos personagens, que permanecem impávidos diante das descobertas de seus deslizes. Não há pena a ser cumprida, a não ser com a nossa própria consciência, no silêncio de cada noite.

 

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