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O ÚLTIMO AMOR DE MR. MORGAN

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A diretora/roteirista alemã Sandra Nettelbeck já havia ficado conhecida pela ótima dramédia familiar “Simplesmente Martha”, onde uma chef de cozinha cabeça dura e autossuficiente herda de repente a sobrinha cujos pais acabaram de falecer, e ainda enfrenta renovações no trabalho com um chef italiano por quem se apaixonara. Tanto que houve uma refilmagem americana com Catherine Zeta-Jones.
 
Agora ela vem com “O Último Amor de Mr. Morgan”, um filme nem bipolar, e sim tripolar: elenco americano (encabeçado pelo sempre ótimo Michael Caine), diretora alemã e locação na França. Não que isso seja um lado negativo, porém com altos e baixos.
 
A parte européia do espírito do filme funciona muito bem, começando com a boa premissa de um idoso (Caine) sem mais elã de viver, que é defendido por jovem francesa (Clémence Poésy, de Harry Potter e o Cálice de Fogo) num ônibus cheio. Daí nasce uma fagulha entre os 2, a partir deste tímido clamor por justiça social. A moça lembra ao senhor a falecida esposa deste, e ele a lembra do falecido pai. Ele é professor de filosofia aposentado, quebrando o galho ensinando inglês a uma elegante senhora francesa que tem uma queda por ele (alheio a isso). E a jovem é professora de dança (chachacha). Só aí haveria inúmeros ricos fatores para explorar… (já explorados em outras obras sobre encontro de gerações como “Vênus” e “Minhas Tardes com Margueritte”).
 
Entretanto, é aí que entra o lado americano do roteiro, não só físico, pois os filhos do idoso aparecem (a eterna arquivo X, fazendo cada vez mais filmes europeus, Gillian Anderson; e Justin Kirk), mas também o conteúdo, pois o que antes era uma delicada relação platônica inominada entre o senhor e a jovem, agora é nomeada pelos filhos como “golpe do baú”, acabando com a finesse. Além disso, americano tem o hábito de explicar demais as coisas, enquanto europeus deixam no ar, pra interpretação ou alusão. E até que o filme sustenta um pouco a falta de comunicação entre os familiares, mas é claro que depois virá tudo mastigadinho, inclusive as lições de vida.
 
Quase por ironia paradigmática, quem permanece acertadamente sem explicações sobre seu passado é a personagem francesa, o que aumenta seu valor e intriga na fita. Não que a interpretação de Caine ainda não tente pegar o volante deste carro derrapando e retomar a direção, pois, afinal, ele por si só já valeria o ingresso, mas a diretora/roteirista teima em pender para o lado americano de drama indie no estilo laboratórios de roteiro Sundance – pois os ótimos silêncios europeus e falta de explicações viram típica lavagem de roupa suja familiar, acertando os pauzinhos com todos os membros, e até acertando os personagens como peças de um tabuleiro de xadrez onde ninguém poderia acabar sozinho, juntando pares improváveis e não satisfatórios. Sem falar que o próprio Caine é obrigado a aprender uma lição de vida para logo depois fazer algo (sem spoilers) que parece contradizer o aprendizado, em troca de um lirismo desnecessário naquele ponto.

 

Alê Shcolnik
Alê Shcolnikhttps://www.rotacult.com.br
Editora de conteúdo e fundadora do site, jornalista, publicitária, fotografa e crítica de cinema (membro da ACCRJ - Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro). Amante das Artes, aprendiz na arte de expor a vida como ela é. Cultura e tattoos nunca são demais!

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